As insurreições dos Hauçá e dos Nagô, na Bahia, em 1807, 1809, 1813, 1826, 1827, 1828, 1830, e a grande revolução de 1835 tem uma fisionomia diferente das fugas e revoltas dos escravos em outras províncias, para a formação de quilombos e mocambos em busca da liberdade perdida. Seus objetivos imediatos, de impor uma alternativa ao sistema político e religioso vigente partiram de suas lideranças letradas de negros ladinos, islamizados que possuíam uma forte formação cultural em suas origens.
O objetivo militar e político de suas revoltas era junto com os escravos do interior, seus iguais, estabelecer um emirado onde "tomariam conta da terra, matando os brancos, cabras e negros crioulos, bem como os negros africanos que se recusassem a aderir ao movimento, e só poupando os mulatos, destinados a servir de lacaios e escravos".
Essas eram pelo menos as causas do levante que permaneceram nos registros históricos oficiais e emanam dos autos dos processos contra os lideres revoltosos. A oposição entre os negros islamizados e seus pares não crentes fica envolta, quando restrita na questão documental, em penumbra, pois se eram isolacionistas, como alegam alguns autores, é um paradoxo que nas revoltas conseguissem reunir tantos aliados contra seu inimigo comum, o estado escravista. As diferenças já relatadas pelos historiadores, analisadas estritamente do ponto de vista étnico ou cultural, ficam mais claras nos termos utilizados pelos seus captores: "negro ladino", como o negro letrado que conhecia a lingua e sabia fazer contas, podendo exercer funções no comércio para os "amos" em oposição ao "negro boçal" que era tangido para os campos ou para a mineração, pois tudo desconhecia da terra, da lingua e das técnicas dos portugueses. Os primeiros tinham ascendência clara sobre os segundos.
Essas eram pelo menos as causas do levante que permaneceram nos registros históricos oficiais e emanam dos autos dos processos contra os lideres revoltosos. A oposição entre os negros islamizados e seus pares não crentes fica envolta, quando restrita na questão documental, em penumbra, pois se eram isolacionistas, como alegam alguns autores, é um paradoxo que nas revoltas conseguissem reunir tantos aliados contra seu inimigo comum, o estado escravista. As diferenças já relatadas pelos historiadores, analisadas estritamente do ponto de vista étnico ou cultural, ficam mais claras nos termos utilizados pelos seus captores: "negro ladino", como o negro letrado que conhecia a lingua e sabia fazer contas, podendo exercer funções no comércio para os "amos" em oposição ao "negro boçal" que era tangido para os campos ou para a mineração, pois tudo desconhecia da terra, da lingua e das técnicas dos portugueses. Os primeiros tinham ascendência clara sobre os segundos.
Na noite de 26 de maio de 1807 a primeira delação sobre o levante chega ao conhecimento do governador que imediatamente parte para sua repressão. Os escravos da capital e os do Recôncavo uniriam forças, segundo o plano estabelecido, para matar seus "senhores". Haviam estruturado com certa maestria seu plano de sedição, levando-se em conta ser essa a primeira revolta. Nomearam um capitão para cada bairro e designaram um "Embaixador" como oficial de ligação entre as comunidades. Aproveitaram o dia da procissão de Corpus Christi, quando a distração dos seus senhores, envolvidos com a litúrgia permitiria que se levantassem em armas e assumissem o poder. Com a delação o governador conseguiu saber a data e o nome dos capitães e o principal local de suas reuniões. Com os acessos da cidade vigiados pelas tropas e os capitães do mato enviados em perseguição dos escravos do campo seus lideres foram facilmente presos e severas medidas foram tomadas contra os fugidos e nenhuma referencia consta nos registros oficiais das punições infligidas a eles.
Continuaram então na surdina sua luta contra o cativeiro, sem esmorecimento, recomeçaram a organização de outro movimento ainda chefiado pelos Hauçás, embora já estreitamente ligados aos Nagô, que dele participaram ativamente. A aversão recíproca que lhes era natural foi deixada de lado em função da desgraça comum da escravidão.
Em 26 de dezembro de 1808, antes de completar um ano do seu levante, os Hauçás e Nagôs dos engenhos do Recôncavo embrenharam-se nas matas, fugindo dos seus "senhores". Combinaram aguardar os escravos da capital que a eles se uniram em 28 de dezembro. Em 4 de janeiro iniciam juntos as hostilidades, com grande violência, atacando indistintamente a todos, destruindo, incendiando propriedades e matando.
Seguem tropas de Salvador para combatê-los, indo alcançá-los dali a nove léguas da cidade, entrincheirados junto a um riacho sendo aí cercados e atacados. O combate violento que se seguiu levou a morte muitos dos negros fugidos e oitenta ainda foram capturados com vida. Com o sufocamento de mais esse levante ficou-se sabendo que pretendiam estender a luta por todo o Recôncavo baiano, especialmente nos distritos de Jaguaribe e Nazaré onde tinham aliados que a policia se apressou a prender. Para êxito do seu movimento haviam estruturado uma organização secreta, a Ogboni, que tinha como objetivo aliciar outros escravos para a luta contra o cativeiro. Sua penetração entre os cativos, como organização tradicional de inspiração religiosa e secreta, e sua grande influência entre os nativos da África desempenharam importante papel na organização da luta. Mais uma vez os registros oficiais omitem as punições aos revoltosos que com certeza foram violentas.
Após um período de relativa calma reacendia mais uma vez o espírito de luta daqueles que estavam sujeitos ao cativeiro. Os escravos de algumas armações, em torno de 600, marcharam na madrugada de 28 de fevereiro de 1813 em direção a Salvador. O grupo de insurretos cedo iniciou os ataques, destruindo senzalas, queimando as casas dos senhores. Mataram a um feitor em sua casa e seguiram depois para atacar Itapoã. Ali incendiaram mais algumas casas e conseguiram a adesão dos escravos que engrossaram seu contingente. Depois de atacarem e matarem alguns brancos naquela localidade, travaram franco combate contra as forças que foram enviadas para sufocar o levante demonstrando heróica bravura no fogo sustentado. No combate morreram cinquenta fugidos, tendo uns se enforcado ao pressentirem a derrota iminente e outros se atirado ao rio Joanes, para não caírem em mãos novamente de seus captores. O balanço de mortos entre os brancos foi de treze pessoas.
Esmagado mais esse levante a ferro e fogo, os escravos começaram o planejamento de um novo movimento de grande proporções para aquele mesmo ano, comandado pelos Hauçá. Uma delação, entretanto, frustrou a iniciativa. Pretendiam aproveitar os folguedos de São João para atacar a Casa de Pólvora de Matatu de onde pegariam a munição molhando o resto que sobrasse para não ser utilizado contra os revoltosos e com isso atrair as tropas contra sí, desguarnecendo a cidade, onde seus aliados vindos do Terreiro e do paço do Saldanha tomariam a cidade degolando todos os brancos e finalmente assumiriam o poder. Por divergências internas quanto a data da sublevação um dos integrantes da conspiração delatou os demais. Os responsáveis pelo levante ao tomar conhecimento da traição conseguiram esconder os materiais que seriam usados na revolta e a policia não logrou encontrar nada que incriminasse seus organizadores.
Continuando as diligencias, foi proibida na festa de São João o uso de foguetes e rojões, com severas penas contra os infratores. Tambores e matracas anunciaram a ordem lida nas ruas de Salvador. Em seguida iniciaram-se as prisões, os escravos revoltosos foram processados e condenados 39 dos implicados na conjura. Doze faleceram nas prisões, vítimas de torturas e maus tratos, quatro foram condenados à morte e executados na Praça da Piedade, com assistência da tropa; inúmeros foram açoitados, outros degredados para Angola, Moçambique e Bengala.
Em 20 de março de 1814 estourou uma revolta na Vila de Cachoeira, em pleno Recôncavo, região agrária onde se estratificara uma nobreza das mais importantes da província. Às cinco horas da tarde daquele dia o juiz de fora de Maragogipe era informado de que os escravos do distrito de Iguape, pertencente a Vila de Cachoeira, tinham se sublevado e praticado desordens. Preparavam-se para seguir em marcha em direção ao Engenho do Ponto para juntarem forças com os cativos daquela senzala.
Cachoeira que depois seria elevada a condição de cidade, na época era Vila de grande importância para toda a província. Possuía orfanato, escola de latim e outros confortos, além da grande produção dos seus engenhos. Tão importante vila não podia ficar a mercê dos escravos fugidos sem que fossem tomadas medidas defensivas por parte das autoridades. Foi o que fez o juiz de fora de Maragogipe, para onde seguiam os sublevados, numa ameaça evidente aos moradores. Enviou um apreensivo ofício ao governador relatando os fatos e pedindo auxílio de forças.
Como prevenção foram colocados guardas da milícia nos pontos onde os escravos poderiam passar, foi mobilizada toda a gente da Ordenança e da Justiça para reforçar a guarda daqueles locais. O sargento-mor das milícias de Cachoeira que se encontrava em Maragogipe partiu sem demora para a vila ameaçada a fim de comandar o combate aos negros fugidos.
A região de Iguape foi incendiada pelos sublevados e o sargento-mor logrou prender três negros hauçás que serviam de ligação entre os engenhos. As demais prisões e as conseqüências dos incêndios não foram documentadas. O certo, no entanto, é que os escravos continuavam se revoltando no Recôncavo baiano, pondo em risco os lucros, a estabilidade e a tranqüilidade da classe senhorial. Suas solicitações constantes de proteção através de ofícios junto ao governo atestam o clima de temor em que estavam constantemente possuídos.
Conforme os registros históricos, a revolta da Cachoeira, em 1814, teve prosseguimento nos anos subseqüentes levando os senhores-de-engenho a pedir a formação de um destacamento para proteger seus bens e suas vidas e oferecer subsídios para armar e manter os soldados e para efetivar as medidas repressivas necessárias contra as sublevações.
No ano de 1822 estourou a rebelião na Vila de São Mateus, com o objetivo de tomar o poder e instalar um reinado nos moldes dos que existiam na África. Segundo os documentos, os negros escravos e forros organizaram uma conjuração contra todos os brancos e pardos. Ao que parece a revolta foi logo sufocada e as prisões se sucederam. Os líderes foram enviados a ferros para a capital. Os escravos se chamavam Claudino de Jesus e Luís Benguela, sendo o último, conforme os autos, o que seria aclamado rei. Deles se perdeu notícia pela falta de documentos remanescentes sobre a devassa.
No ano de 1826 formou-se um quilombo nas matas do Urubu, num sítio denominado Cajazeira, perto de Salvador. Começou sua atividade com pequenas escaramuças nas redondezas e preparavam-se para um ataque de grande envergadura à capital. No dia 15 de dezembro daquele ano praticaram alguns ataques contra os lavradores e seqüestraram uma menina que foi "muito maltratada" e teve de ser recolhida ao Hospital da Misericórdia. Em conseqüência dos atentados praticados pelos quilombolas, alguns capitães-do-mato foram incumbidos de prendê-los e entraram em luta nas matas onde se refugiavam. Os fugidos opuseram grande resistência e na luta mataram dois capitães-do-mato e feriram um terceiro. Tropas militares compostas de 20 praças do Batalhão de Pirajá e mais 12 soldados e um cabo da Divisão Militar vindos da capital comandados pelo Coronel Francisco da Costa Branco foram enviados com presteza e fizeram junção na baixa do Urubu.
A tropa que partira da capital encontrou no caminho um capitão-do-mato e mais dois crioulos gravemente feridos na refrega. Ao chegarem no campo foram percebidos pelos vigias dos quilombolas que imediatamente deram alarme fazendo uso de uma guampa de boi por corneta. Foi dada ordem de atacar para a coluna pelo oficial comandante.
A essa tropa que havia reunido cerca de trinta homens, opuseram-se cinquenta negros fugidos usando como armas apenas facas, facões, lanças e lazarinas e mais outras armas curtas improvisadas aos gritos de Mata! Mata! lançando-se bravamente sobre os soldados.
A tropa abriu fogo sobre os guerreiros que, depois de alguma resistência, abandonaram o campo deixando para trás quatro mortos, três homens e uma mulher. Aproveitaram o tardar da hora para esconderem-se no mato protegidos pela escuridão da noite. Pretendiam se reorganizar. Nessa ocasião prenderam a escrava Zeferina que lutou bravamente, de arco e flechas nas mãos, antes de ser submetida pelos soldados. Além disso grande quantidade de provisões foram apreendidas.
A policia iniciou a repressão e suas tropas seguiram para os lugares conhecidos de reunião dos negros e considerados suspeitos. Começaram as batidas nas matas sendo varadas casas de negros e pardos e efetuadas várias prisões. Farto material religioso foi aprendido. Entre os presos um soldado do 1° Batalhão da 2° Linha, Cristovão Vieira.
Todos os presos foram recolhidos no Forte do Mar, com exceção do soldado que foi recolhido ao quartel. No dia 30 de maio de 1827 faleceram na prisão, pelas torturas inflingidas, os negros José e Paulo. Um pai de santo chamado Antonio que dirigia uma Casa de Candomblé nas proximidades do Quilombo foi preso junto com os demais.
Tudo indica que esses quilombolas pretendiam realizar uma insurreição de maior envergadura com o auxilio dos escravos que viviam na capital e que pretendiam reunir-se com eles. A falta de organização e a exposição excessiva de seus objetivos com os ataques preliminares de menor monta atraindo a repressão prematuramente leva a crer que suas ações foram motivadas por questões além da sua vontade, levados pelas circunstâncias dos acontecimentos dos quais não tinham controle absoluto. A falta de armamentos eficazes corrobora com a idéia de falta de planejamento dos revoltosos que não dispunham sequer de armas de fogo.
Mais uma vez deixamos de saber o destino desses revoltosos por falta de registros, mas podemos inferir que sofreram as penalidades previstas nesses casos, quase sempre brutais, visando dar o exemplo aos demais cativos através da opressão do medo.
No dia 22 de abril de 1827, ainda nem haviam terminado as repressões contra o movimento anterior e os escravos do Engenho Vitória se sublevaram, seguindo o exemplo de seus companheiros que sucessivamente vinham se revoltando contra a opressão dos "senhores". Foram violentas as suas ações só sendo debelada a insurreição dois dias depois. Pouca documentação restou desses acontecimentos.
Pouco menos de um ano depois, no dia 11 de março de 1828 novo levante foi registrado. Na madrugada daquele dia uma porção de cativos dos engenhos próximos a Cabrito uniram-se a parte amotinada dos escravos da capital e se prepararam para atacar Salvador. Reunidos na Armação, plano que já haviam intentado antes, em 1826, foram no entanto surpreendidos pela policia, que contra eles marchou e deu com eles nas imediações de Pirajá. Ali o corpo de polícia e o 2° Batalhão de Linha deram combate aos insurretos matando muitos e levando os sobreviventes para serem punidos.
No dia 10 de abril de 1830 pela manhã, por nada, como de improviso, os violentos acontecimentos foram sucedendo em escala crescente. O primeiro ataque dos negros revoltosos foi contra uma loja localizada na Ladeira da Fonte das Pedras, para obterem armas para dar prosseguimento ao levante. Alcançaram seu objetivo inicial, pois após pequena resistência do proprietário, arrecadaram doze espadas de copos e cinco "paraíbas", deixando ferido o dono do estabelecimento, além do caixeiro, atingido com forte cutilada na cabeça e uma estocada na nádega.
O número de escravos em luta aumentou imediatamente. No início do levante era pequeno o número de revoltosos. Uns dezoito a vinte segundo registram os autos do processo contra um dos implicados. Já no fim da refrega havia mais de cem.
Conseguido o primeiro assalto para obter armas, marcharam para atacar uma casa de ferragens. Ali encontraram tenaz resistência da parte do proprietário e dos seus empregados, que reagiram armados de bacamarte e espadas. Ante a inesperada resistência, os revoltosos resolveram prudentemente recuar, apenas conquistando mais um "paraíba". Seguiram em direção a outra casa comercial e, após rápido ataque se apoderaram de mais cinco.
No caminho a multidão de sublevados vai crescendo. Os cabeças de motim, como diriam os autos, empunhavam espadas e vestiam camisas azuis e vermelhas, vão seguindo a frente do grupo, atacando os armazéns de negros "novos" na Rua do Julião, de onde mais cem negros se incorporam imediatamente ao levante. Era uma luta de vida e morte para recuperar seu bem mais precioso, a liberdade.
Depois de libertarem os cativos daquela armação, deixando gravemente ferido o guarda de escravos marcharam para atacar a guarda da polícia de Soledade, composta de sete soldados e um sargento. Conseguem pelo maior número vencer a guarda. Entretanto o planejamento deficiente de seus líderes prejudicam as ações bélicas e dão tempo para os "senhores" recobrarem a coragem.
As forças da polícia e mais alguns civis investem sobre eles, obrigando-os, depois de sangrento combate em que morreram mais de cinquenta e ficaram prisioneiros quarenta e um, a recuarem para as matas de São Gonçalo, onde tentam reagrupar as forças. A escolta militar em perseguição não lhes dá folga e, cercados por todos os lados, são definitivamente batidos pelo "estado senhorial". Nos autos o promotor pedirá punição exemplar aos faltosos, para segundo ele: "conservação do sossêgo público e desagravo da Sociedade ofendida".
A repressão caiu com força contra a comunidade dos cativos. Os pretos eram espancados nas ruas, linchados, apedrejados, . Os soldados prendiam qualquer um escravo que encontrassem. Depois disso as sentenças foram proferidas: os negros Nicolau e Francisco são condenados a quatrocentos açoites cada, "dados interpoladamente, cinquenta por dia cada vez", além de arcarem com as custas dos autos. O advogado de defesa de um dos réus denunciou a repressão injusta a que muitos foram submetidos pela sedição de poucos. Acusou abertamente os assassinatos e linchamentos que se seguuiram praticados pela polícia e pelos civis: "matavam indistintamente a quantos encontravam dispersos, sejam ou não cúmplices", e que inúmeros foram mortos pelos "soldados e povo". A revolta foi sufocada com sangue.
Cachoeira que depois seria elevada a condição de cidade, na época era Vila de grande importância para toda a província. Possuía orfanato, escola de latim e outros confortos, além da grande produção dos seus engenhos. Tão importante vila não podia ficar a mercê dos escravos fugidos sem que fossem tomadas medidas defensivas por parte das autoridades. Foi o que fez o juiz de fora de Maragogipe, para onde seguiam os sublevados, numa ameaça evidente aos moradores. Enviou um apreensivo ofício ao governador relatando os fatos e pedindo auxílio de forças.
Como prevenção foram colocados guardas da milícia nos pontos onde os escravos poderiam passar, foi mobilizada toda a gente da Ordenança e da Justiça para reforçar a guarda daqueles locais. O sargento-mor das milícias de Cachoeira que se encontrava em Maragogipe partiu sem demora para a vila ameaçada a fim de comandar o combate aos negros fugidos.
A região de Iguape foi incendiada pelos sublevados e o sargento-mor logrou prender três negros hauçás que serviam de ligação entre os engenhos. As demais prisões e as conseqüências dos incêndios não foram documentadas. O certo, no entanto, é que os escravos continuavam se revoltando no Recôncavo baiano, pondo em risco os lucros, a estabilidade e a tranqüilidade da classe senhorial. Suas solicitações constantes de proteção através de ofícios junto ao governo atestam o clima de temor em que estavam constantemente possuídos.
Conforme os registros históricos, a revolta da Cachoeira, em 1814, teve prosseguimento nos anos subseqüentes levando os senhores-de-engenho a pedir a formação de um destacamento para proteger seus bens e suas vidas e oferecer subsídios para armar e manter os soldados e para efetivar as medidas repressivas necessárias contra as sublevações.
No ano de 1822 estourou a rebelião na Vila de São Mateus, com o objetivo de tomar o poder e instalar um reinado nos moldes dos que existiam na África. Segundo os documentos, os negros escravos e forros organizaram uma conjuração contra todos os brancos e pardos. Ao que parece a revolta foi logo sufocada e as prisões se sucederam. Os líderes foram enviados a ferros para a capital. Os escravos se chamavam Claudino de Jesus e Luís Benguela, sendo o último, conforme os autos, o que seria aclamado rei. Deles se perdeu notícia pela falta de documentos remanescentes sobre a devassa.
No ano de 1826 formou-se um quilombo nas matas do Urubu, num sítio denominado Cajazeira, perto de Salvador. Começou sua atividade com pequenas escaramuças nas redondezas e preparavam-se para um ataque de grande envergadura à capital. No dia 15 de dezembro daquele ano praticaram alguns ataques contra os lavradores e seqüestraram uma menina que foi "muito maltratada" e teve de ser recolhida ao Hospital da Misericórdia. Em conseqüência dos atentados praticados pelos quilombolas, alguns capitães-do-mato foram incumbidos de prendê-los e entraram em luta nas matas onde se refugiavam. Os fugidos opuseram grande resistência e na luta mataram dois capitães-do-mato e feriram um terceiro. Tropas militares compostas de 20 praças do Batalhão de Pirajá e mais 12 soldados e um cabo da Divisão Militar vindos da capital comandados pelo Coronel Francisco da Costa Branco foram enviados com presteza e fizeram junção na baixa do Urubu.
A tropa que partira da capital encontrou no caminho um capitão-do-mato e mais dois crioulos gravemente feridos na refrega. Ao chegarem no campo foram percebidos pelos vigias dos quilombolas que imediatamente deram alarme fazendo uso de uma guampa de boi por corneta. Foi dada ordem de atacar para a coluna pelo oficial comandante.
A essa tropa que havia reunido cerca de trinta homens, opuseram-se cinquenta negros fugidos usando como armas apenas facas, facões, lanças e lazarinas e mais outras armas curtas improvisadas aos gritos de Mata! Mata! lançando-se bravamente sobre os soldados.
A tropa abriu fogo sobre os guerreiros que, depois de alguma resistência, abandonaram o campo deixando para trás quatro mortos, três homens e uma mulher. Aproveitaram o tardar da hora para esconderem-se no mato protegidos pela escuridão da noite. Pretendiam se reorganizar. Nessa ocasião prenderam a escrava Zeferina que lutou bravamente, de arco e flechas nas mãos, antes de ser submetida pelos soldados. Além disso grande quantidade de provisões foram apreendidas.
A policia iniciou a repressão e suas tropas seguiram para os lugares conhecidos de reunião dos negros e considerados suspeitos. Começaram as batidas nas matas sendo varadas casas de negros e pardos e efetuadas várias prisões. Farto material religioso foi aprendido. Entre os presos um soldado do 1° Batalhão da 2° Linha, Cristovão Vieira.
Todos os presos foram recolhidos no Forte do Mar, com exceção do soldado que foi recolhido ao quartel. No dia 30 de maio de 1827 faleceram na prisão, pelas torturas inflingidas, os negros José e Paulo. Um pai de santo chamado Antonio que dirigia uma Casa de Candomblé nas proximidades do Quilombo foi preso junto com os demais.
Tudo indica que esses quilombolas pretendiam realizar uma insurreição de maior envergadura com o auxilio dos escravos que viviam na capital e que pretendiam reunir-se com eles. A falta de organização e a exposição excessiva de seus objetivos com os ataques preliminares de menor monta atraindo a repressão prematuramente leva a crer que suas ações foram motivadas por questões além da sua vontade, levados pelas circunstâncias dos acontecimentos dos quais não tinham controle absoluto. A falta de armamentos eficazes corrobora com a idéia de falta de planejamento dos revoltosos que não dispunham sequer de armas de fogo.
Mais uma vez deixamos de saber o destino desses revoltosos por falta de registros, mas podemos inferir que sofreram as penalidades previstas nesses casos, quase sempre brutais, visando dar o exemplo aos demais cativos através da opressão do medo.
No dia 22 de abril de 1827, ainda nem haviam terminado as repressões contra o movimento anterior e os escravos do Engenho Vitória se sublevaram, seguindo o exemplo de seus companheiros que sucessivamente vinham se revoltando contra a opressão dos "senhores". Foram violentas as suas ações só sendo debelada a insurreição dois dias depois. Pouca documentação restou desses acontecimentos.
Pouco menos de um ano depois, no dia 11 de março de 1828 novo levante foi registrado. Na madrugada daquele dia uma porção de cativos dos engenhos próximos a Cabrito uniram-se a parte amotinada dos escravos da capital e se prepararam para atacar Salvador. Reunidos na Armação, plano que já haviam intentado antes, em 1826, foram no entanto surpreendidos pela policia, que contra eles marchou e deu com eles nas imediações de Pirajá. Ali o corpo de polícia e o 2° Batalhão de Linha deram combate aos insurretos matando muitos e levando os sobreviventes para serem punidos.
No dia 10 de abril de 1830 pela manhã, por nada, como de improviso, os violentos acontecimentos foram sucedendo em escala crescente. O primeiro ataque dos negros revoltosos foi contra uma loja localizada na Ladeira da Fonte das Pedras, para obterem armas para dar prosseguimento ao levante. Alcançaram seu objetivo inicial, pois após pequena resistência do proprietário, arrecadaram doze espadas de copos e cinco "paraíbas", deixando ferido o dono do estabelecimento, além do caixeiro, atingido com forte cutilada na cabeça e uma estocada na nádega.
O número de escravos em luta aumentou imediatamente. No início do levante era pequeno o número de revoltosos. Uns dezoito a vinte segundo registram os autos do processo contra um dos implicados. Já no fim da refrega havia mais de cem.
Conseguido o primeiro assalto para obter armas, marcharam para atacar uma casa de ferragens. Ali encontraram tenaz resistência da parte do proprietário e dos seus empregados, que reagiram armados de bacamarte e espadas. Ante a inesperada resistência, os revoltosos resolveram prudentemente recuar, apenas conquistando mais um "paraíba". Seguiram em direção a outra casa comercial e, após rápido ataque se apoderaram de mais cinco.
No caminho a multidão de sublevados vai crescendo. Os cabeças de motim, como diriam os autos, empunhavam espadas e vestiam camisas azuis e vermelhas, vão seguindo a frente do grupo, atacando os armazéns de negros "novos" na Rua do Julião, de onde mais cem negros se incorporam imediatamente ao levante. Era uma luta de vida e morte para recuperar seu bem mais precioso, a liberdade.
Depois de libertarem os cativos daquela armação, deixando gravemente ferido o guarda de escravos marcharam para atacar a guarda da polícia de Soledade, composta de sete soldados e um sargento. Conseguem pelo maior número vencer a guarda. Entretanto o planejamento deficiente de seus líderes prejudicam as ações bélicas e dão tempo para os "senhores" recobrarem a coragem.
As forças da polícia e mais alguns civis investem sobre eles, obrigando-os, depois de sangrento combate em que morreram mais de cinquenta e ficaram prisioneiros quarenta e um, a recuarem para as matas de São Gonçalo, onde tentam reagrupar as forças. A escolta militar em perseguição não lhes dá folga e, cercados por todos os lados, são definitivamente batidos pelo "estado senhorial". Nos autos o promotor pedirá punição exemplar aos faltosos, para segundo ele: "conservação do sossêgo público e desagravo da Sociedade ofendida".
A repressão caiu com força contra a comunidade dos cativos. Os pretos eram espancados nas ruas, linchados, apedrejados, . Os soldados prendiam qualquer um escravo que encontrassem. Depois disso as sentenças foram proferidas: os negros Nicolau e Francisco são condenados a quatrocentos açoites cada, "dados interpoladamente, cinquenta por dia cada vez", além de arcarem com as custas dos autos. O advogado de defesa de um dos réus denunciou a repressão injusta a que muitos foram submetidos pela sedição de poucos. Acusou abertamente os assassinatos e linchamentos que se seguuiram praticados pela polícia e pelos civis: "matavam indistintamente a quantos encontravam dispersos, sejam ou não cúmplices", e que inúmeros foram mortos pelos "soldados e povo". A revolta foi sufocada com sangue.